Belgrado era uma daquelas cidades que me estava atravessada na garganta, se é que me entendem. Na viagem de 2010 pelos Balcãs foi para mim penoso ter que cortar a Sérvia, e em particular Belgrado, do roteiro, por questões de tempo mas também por querermos fazer o percurso pela costa. Dois anos volvidos, chegara finalmente a hora de conhecer a capital da ex-Juguslávia, a Cidade Branca.
Viagem para Belgrado
Optamos pelo comboio nocturno para esta viagem. Saímos de Sófia pelo final do dia ou hora de jantar, não me recordo bem, e chegamos cedinho a Belgrado, pelas 7h.
Tínhamos lido muita coisa sobre esta viagem na net, desde relatos acerca da beleza do percurso até verdadeiros pesadelos de avarias, extorsão, etc. Algo se viria a tornar mais importante para nós, uma vez que tínhamos lido que regra geral os responsáveis pela carruagem-dormitório aceitavam, quando o comboio não estava cheio, uma pequena "oferenda" em troca de um dormitório de 6 camas para uma ou 2 pessoas.
Assim foi conosco, à chegada um senhor simpático com um inglês básico, explicou-nos como funcionava a carruagem assim como todos os serviços prestados, incluindo a possibilidade de podermos ficar com um compartimento só para nós por "little money". Não se falou em preços e expliquei que só tinha dinheiro búlgaro (por acaso tinha euros mas a nota mais pequena era de 20€), o que não foi problema. Comprometi-me a levantar dinheiro na estação e regressar ao comboio para entregar a dita "oferenda". A viagem correu bem e eu dormi que nem lorde, pese o facto de a Catarina só ter conseguido 1 ou 2h de sono no máximo, com medo do saca-rins! E a cena é que ele apareceu, a meio da noite! Numa das paragens para "manutenção" do comboio, habituais por estas paragens, alguém enfia a mão pela janela (estava um calor infernal), rouba rapidamente algo da cama de cima, onde tinha a mochila, e põe-se em fuga! O pobre coitado levou uma meia suja...
À chegada, cumpri com o prometido e regressei à plataforma para retribuir a simpatia ao senhor mas ele e o comboio já haviam partido. Não sei porquê, pela cara dele, sempre me pareceu que ele sabia que isto iria acontecer e isso não fez a mínima diferença. Mais tarde voltaria a ter um senhor em tudo parecido a recusar-se vender-nos bilhetes de autocarro, oferecendo-nos a viagem.
O impacto da chegada
Belgrado não sendo das cidades mais bonitas que visitei, é sem dúvida uma das mais fascinantes. A vida frenética, com ruas entupidas de gente em ambos os sentidos, mesmo à noite em qualquer dia da semana, o trânsito imenso, a imensa mistura de estilos arquitectónicos, fruto das convulsões constantes que assolaram a cidade no século XX.
A chegada é o primeiro choque, edifícios do período do Império Austro-Húngaro mesclados com edifícios megalómanos do período Juguslavo, não esquecendo os monos de betão e a estranha Novi-Beograd. A junção do rio Sava ao Danúbio faz o resto.
Caminhamos até ao hostel, perto da estação e do centro, mas ninguém atendeu a campainha. Segundo a papelada do hostelbookers, o check-in abria às 8h mas acabaram por chegar às 9h. Até lá aguardamos num pequeno café perto do McDonalds onde assistimos perplexos a um grupo de adolescentes, estudantes de uma escola de arte das proximidades, a tomarem o seu pequeno almoço, que ia desde batatas fritas do dito McDonalds a Cevapci, uma espécie de kebab dos balcãs, em que almôndegas de carne picada com especiarias moldada em forma de "dedos", é grelhada atafulhada para dentro de um pão com salada, batatas fritas e molho. Muita gente come-os com um pequeno garfinho ou palito de plástico, dada a dimensão da coisa. Geralmente são baratas, lembro-me que um dia almoçamos os 2 um menu do género (cevapci + batata + bebida de lata), por 5€ (2,5€ por pessoa).
Depois de instalados saímos para explorar um pouco da cidade enquanto fazíamos tempo para uma tour gratuita pela cidade que tinha início às 11h. Foi o primeiro confronto com um calor abrasivo que mais uma vez se fazia sentir, desta feita acentuado pelas grandes avenidas asfaltadas.
3 da tarde em Belgrado
|
Caminhamos até à Praça da República, circulamos um pouco pelas avenidas pedonais circundantes e passamos pelo Parque dos Estudantes. Regressamos à praça e após uma breve pausa numa esplanada com aspersores e uma Jelen Pivo bem fresquinha, inciamos o nosso tour.
Ponto de Encontro: Trg (praça) Republike, Museu em restauro de fundo...
|
Após uma breve explicação acerca da praça, seguimos para o Skadarlija, outrora o bairro boémio da cidade, onde viviam os actores mais pobres e onde se localizavam as principais cervejarias e tascas da cidade. Hoje em dia é um dos quarteirões mais pitorescos pese o facto de ser já demasiado turistíco, estando grande parte da rua ocupada com esplanadas de restaurantes com música popular ou clássica ao vivo. Ainda assim, um bom sítio para começar, com um a oferta de um shot de Rakja caseira (uma espécie de aguardente, que pode ser feita de vários frutos. Muito parecida com o Raki albanês em termos de sabor, mas mais forte (esta em especial, por ser produção caseira).
"Mixórdia" Arquitectónica
|
Skardalja
|
Seguimos pelo "Sillicon Valley" de
Belgrado, a Stahinjica Bana Ulica (Rua), não por ser
fértil em tecnologia mas sim por ser a zona mais cara da cidade, onde as
senhoras vão fazer os seus "boob jobs" e os senhores passear as suas
bombas novas. Escusado será dizer que os preços nesta rua são substancialmente
mais altos, próximos aos preços de Portugal. Seguimos para a Mesquita, segundo
o guia a única na cidade mas viríamos a encontrar pelo menos mais uma.
Esta foi incendiada aquando do conflito com o Kosovo, como retaliação por terem
sido incendiadas igrejas ortodoxas no território. Nas proximidades existem
algumas dos poucos edifícios que restam do período Otomano.
Edifício Residencial Otomano mais antigo da cidade, se não estou em erro...
|
Mesquita que o guia garantiu, erradamente, ser a única em Belgrado
|
Edifício Otomano no Kalemegdan
|
Prosseguimos para o Forte, passando pelo Zoo. Do forte a vista é impressionante, especialmente sobre os rios. No regresso ao centro, passamos pela Kavana "?" - uma das mais antigas de Belgrado e das poucas ainda abertas no centro da cidade. Visitamos logo ao lado, a Igreja Ortodoxa Sérvia, não a maior mas a mais importante da cidade, sendo também a segunda igreja ortodoxa eslava mais antiga do mundo, depois da búlgara que iremos ver num post mais adiante). Ainda o Banco Nacional, que vale a pena visitar para perceber os períodos conturbados da história recente da Sérvia e seus efeitos na moeda. A entrada é grátis e ainda se traz como recordação uma nota com a nossa cara!
Igreja Ortodoxa |
Interior da Igreja |
Seguiu-se um intervalo para almoço, que viria a ficar por 12€ para os 2, prosseguimos então para o tour da tarde, este pago (mesmo guia). Neste iríamos visitar alguns bunkers assim como uma caverna onde estão guardados artefactos históricos.
Ana "Shopska" Catarina
|
Troll do Bunker
|
No final, terminamos com uma visita a umas caves de vinho junto ao rio Sava, no local onde antigamente praticamente só existiam caves e onde eram carregados os barcos. O vinho, tinto, assemelhava-se ai nosso verde tinto de fraca qualidade Ainda assim, valeu a pena pela interacção com o guia, que nos permitiu perceber melhor como viviam os habitantes da cidade, assim como as suas expectativas futuras.
Nessa noite, jantamos Mussaka e Pilaf, dois pratos típicos, num bom restaurante perto de uma agência onde iríamos fazer um tour nocturno - afinal de contas estávamos na suposta "party capital" dos Balcãs, segundo alguns bem mais exagerados, da Europa.
Ana "Pilaf" Costa
|
Mussaka
|
No entanto, assim que chegamos à dita agência, estava encerrada. Fizemos então nós o tour nocturno mas como era domingo, não haviam muitas opções, pelo que fomos a um bar ao ar livre, perto do parque Kalemegdan, onde tínhamos estado durante o dia. Durante o passeio pelas ruas pedonais do centro de belgrado, fomos confrontados com a actividade frenética da cidade, mesmo num Domingo à noite, em que as avenidas estavam repletas de gente a transitar pelas longas avenidas em ambos os sentidos. Pela meia noite, finalmente acalmou e chegamos ao dito bar, para uma bebida antes de recolher.