02/01/17

Como chegar à Coreia do Norte?



A ideia de visitar a  Repúblico Popular Democrática da Coreia (ou como é vulgarmente conhecida, Coreia do Norte), foi amadurecendo ao longo de mais de uma década. Uma vez que íamos estar em Pequim e que os preços das tours para este peculiar país caíram nos últimos anos, decidimos que estava na hora de lá ir. Contrariamente ao que muita gente possa crer, é bem fácil entrar na Coreia do Norte: basta reservar uma viagem numa das agências autorizadas, preencher um formulário para obtenção do visto (similar ao da China ou Rússia) e tratar do mesmo.

Quem estiver interessado em saber os motivos que me levaram a querer visitar este país, pode passar por este post de Agosto de 2015.

Este último passo, que poderia ser o problemático, é na realidade também ele muito fácil. Uma vez que não há representação diplomática do país em Portugal, optamos por pagar 50 euros à agência que organizou a nossa viagem para tratar dele por nós na China. A alternativa seria enviar o passaporte para a embaixada em Londres e embora o preço seja inferior, com os gastos em correios fica ela por ela. Desde que se apresente um comprovativo da reserva da tour e se preencha devidamente o impresso, o visto é praticamente garantido (um dos nossos colegas de viagem tratou do dele na embaixada em Berlim sem qualquer problema). Se o visto for tirado na China, não fica no passaporte mas sim num “cartão do viajante” que no final é recolhido na fronteira.




A maior parte dos viajantes parte de Pequim, seja de avião ou de comboio. Qualquer cidadão de qualquer país pode entrar por qualquer uma das vias, excepto os dos EUA que só podem entrar (e sair) de avião e os da República da Coreia (Coreia do Sul), que não estão de todo autorizados a viajar para o país na actualidade (até há poucos anos podiam visitar mesmo sem visto algumas zonas no sul do país). Há ainda voos semanais a partir de Xangai e um comboio proveniente de Vladivostok - uma continuação do trajecto clássico do transiberiano - mas em teoria (e digo-o desta forma pois há relatos em sentido contrário) a travessia desta fronteira por parte de viajantes deixou de ser permitida.

Nós tínhamos feito o trajecto Transmongoliano porque gostamos de viajar de comboio, logo optamos por entrar e sair do país desta forma, que aconselhamos vivamente pois assim conseguem ter uma ideia de como são as regiões rurais do interior do país. A viagem desde Pequim tem início pelas 17h e dura 27h, sendo que “apenas” 7h, no período diurno, são em território norte-coreano. No percurso inverso, a viagem começa pelas 10h e a paragem na fronteira é suficiente para jantar e ainda conhecer a estátua de Mao na praça em frente à estação.

A travessia da fronteira, talvez por tudo o que já ouvimos e lemos sobre o país e o regime que o governa, é sempre um momento de tensão para qualquer viajante. O processo na entrada foi o mais exaustivo porque passamos, na saída bem mais relaxado. O guia ocidental do nosso grupo, o jovem e simpático Rayco das ilhas Canárias que gera a empresa KTG - que recomendamos vivamente - explicou-nos todas as formalidades ainda antes de entrarmos no comboio coreano na estação de Dandong, no lado chinês da fronteira.

Um ou dois minutos após a partida do comboio atravessa-se a ponte sobre o riu Yalu, fronteira natural entre os países. Nesta travessia é possível contemplar bem de perto aquela que será a principal atracção de Dandong, o que resta da antiga ponte que ligava os dois países e que foi destruída pelos bombardeamentos americanos na Guerra da Coreia. Umas centenas de metros depois de chegar ao lado coreano, o comboio para na estação de Sinuiju - principal cidade fronteiriça do país, que se encontra a uns bons kms dali - e é aqui que todo o processo tem lugar. Há 3 impressos a preencher, um para a imigração, outro para a alfândega e ainda um terceiro por questões de saúde pública, onde é necessário mencionar os países por se passou recentemente bem como eventuais condições de saúde contagiosas. 

Os papeis vão sendo recolhidos um a um por soldados, juntamente com os passaportes e vistos. Um deles inspecciona as malas - no meu caso tive mesmo que esvaziar praticamente toda a mala - ao passo que todos os artigos electrónicos, de declaração obrigatória num dos impressos, são colocados em cima da mesa do compartimento para serem inspecionados. Aqui a revista foi menos exaustiva - até porque havia uma mesa completamente coberta deles - e a senhora mostrou-se mais interessada por máquinas fotográficas e portáteis. Nesta fase do processo é de facto importante ter um guia que fale algumas palavras de coreano ou mandarim pois ninguém fala inglês. Após a inspecção, são devolvidos os passaportes e cartões com o visto e a viagem prossegue com umas 3 paragens pelo caminho. Todo o processo leva umas duas horas, uma vez que esta revista se estende a todos os passageiros, incluindo chineses e locais.

O comboio, de fabrico coreano, era moderno e em tudo similar a um comboio normal chinês mas com o corredor mais estreito. Contrariamente ao que lemos em alguns relatos, mesmo após a fronteira o comboio tem vagão restaurante e as refeições servidas a bordo têm preços razoáveis, sendo possível pagar em remimbi chinês ou em euros. O troco é sempre fornecido numa destas moedas, nunca em won norte-coreano. 



Há ainda a passagem relativamente frequente de carrinhos de venda de snacks e bebidas. Algo que também é ambíguo nos vários relatos que lemos, e pode ter mudado recentemente, é o grau de contacto com norte-coreanos no comboio. Os nossos lugares eram num compartimento para 6 pessoas, onde viajava connosco uma família de norte-coreanos que vinham da China. O “pai de família” era dentista e falava inglês, pelo que rapidamente se meteu à conversa connosco não só para saber de onde vínhamos e porque decidimos visitar o país mas também para nos falar das virtudes do seu país, como saúde, educação e habitação gratuitas. Não vimos qualquer “rede” - como lemos em alguns relatos - a dividir o comboio mas é um facto que a certa altura as funcionárias do restaurante nos foram chamar quando seguíamos para lá do restaurante. Nunca chegamos a perceber porquê, até porque a carruagem parecia exactamente igual à nossa.


A viagem de comboio começa em terreno montanhoso, como é quase todo o norte e centro do país, e permite vislumbrar um pouco do quotidiano dos norte-coreanos fora das cidades: pequenas aldeias de casas típicas, praticamente todas iguais, alternadas com pequenas cidades de blocos ao estilo soviético. O campos são trabalhados manualmente, por toda a gente incluindo soldados, e nas estradas vêm-se alguns camiões, muito poucos carros ou motas, deslocando-se as pessoas maioritariamente de bicicleta, a pé ou de carroça. 










Com o aproximar da capital, chegam terrenos mais planos e alguma indústria, bem como o... anoitecer. À chegada a Pyongyang, os guias norte coreanos aguardam-nos na estação de comboios e passam a ser companhia constante durante toda a viagem.

Os "4 em linha" à direita eram os guias dos nossos grupos.

A viagem de avião é, segundo nos disseram, uma viagem normal (que mais poderia ser?) onde também é perfeitamente possível viajar ao lado de cidadãos do país. À chegada ao aeroporto, a inspecção é bem menos rigorosa aproximando-se de uma qualquer chegada a outro país com os habituais procedimentos: imigração, alfândega, recolha de malas e saída do aeroporto. Uma vez mais, os guias aguardam os turistas e acompanham-nos até ao hotel. Os voos de Pequim são todos na Air Koryo, companhia aérea norte-coreana, e têm frequência trisemanal. A companhia aérea tem no seu site voos com partidas de Shenyang, Xangai, Vladivostok e Bangkok com frequência semanal. 

Estação de Comboios de Pyongyang
Por fim, a saída do país foi bem tranquila. Como parte do grupo ficava mais um dia no país, partimos de comboio sem o nosso guia com mais três pessoas que tinham entrado de avião, pelo que o nosso guia nos pediu para os orientar (embora tenha entregue a toda a gente um folha com todos os passos a seguir). Na fronteira tivemos que preencher novamente impressos para a imigração e alfândega e repetiu-se a inspecção mas numa versão mais light: ninguém quis que abríssemos as malas e passaram uma vistoria rápida por algumas das fotos que tinha na minha máquina (viram umas dezenas em várias centenas delas), sendo que foi a única a ser inspecionada. Minto, um outro soldado quis “inspecionar” a action cam da Sony mas parecia mais interessado em perceber o que aquilo era e como funcionava do que nos vídeos propriamente ditos.




 
Não perca o relato completo da nossa visita a este país único:

 

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